sábado, 10 de abril de 2010



"E então viu a criança. Era uma pelanca inchada e ressecada que todas as formigas do mundo iam arrastando trabalhosamente para os seus canais pelo caminho de pedras do jardim. Aureliano não conseguiu se mover. Não porque estivesse paralisado pelo horror, mas porque naquele instante prodigioso revelaram-se as chaves definitivas de Melquíades e viu a epígrafe dos pergaminhos perfeitamente ordenada no tempo e no espaço dos homens: O primeiro da estirpe está amarrado a uma árvore e o último está sendo comido pelas formigas.
(...)
Era a história da família, escrita por Melquíades inclusive nos detalhes mais triviais, com cem anos de antecipação. (...) A proteção final, que Aureliano começava a vislumbrar quando se deixou confundir pelo amor de Amaranta Úrsula, radicava em Melquíades ter ordenado os fatos não no tempo convencional dos homens, mas concentrando tudo em um século de episódios cotidianos, de modo que todos coesistiram ao mesmo tempo. Fascinado pela descoberta, Aureliano leu em voz alta , sem saltos, as encíclicas cantadas que o próprio Melquíades fizera Arcadio escutar e que, na realidade, eram as predições da sua execução, e encontrou anunciado o nascimento da mulher mais bela do mundo que estava subindo ao céu de corpo e alma, e conheceu a origem de dois gêmeos póstumos que renunciavam a decifrar os pergaminhos, não só por incapacidade e inconstância, mas porque as suas tentativas eram prematuras. Neste ponto, impaciente por conhecer a sua própria origem, Aureliano deu um salto. Então começou o vento, fraco, incipiente, cheio de vozes do passado, de murmúrios de gerãnios antigos, de suspiros de desenganos anteriores às nostalgias mais persistentes.
(...)
Então deu outro salto para se antecipar às predições e averiguar a data e as circunstâncias da sua morte. Entretanto, antes de chegar ao verso final já tinha compreendido que não sairia nunca daquela quarto, pois estava previsto que a cidade dos espelhos (ou das miragens) seria arrasada pelo vento e desterrada da memória dos homens no instante em que Aureliano Babilonia acabasse de decifrar os pergaminhos e que tudo o que estava escrito neles era irrepetível desde sempre e por todo o sempre, porque as estirpes condenadas a cem anos de solidão não tinham uma segunda oportunidade sobre a terra."

Cem anos de solidão - Gabriel García Márquez (últimas páginas, 392 a 394)


Não tem muito o que comentar, um dos melhores livros que eu já li... Não é a toa que ganhou o prêmio Nobel de literatura. No início não se dá nada por ele, mas ele tem o poder de te puxar e te prender de uma forma misteriosa, te surpreendendo no decorrer da história.
Personagens incríveis, situações surreais e enlouquecedoras, simplesmente maravilhoso.
Só lendo pra saber!

E agradeço ao meu primo, Rafa, por ter me indicado, espero mais indicações...

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